Excelentíssimos ministros da Fazenda, Fernando Haddad, da Saúde, Alexandre Padilha, Senador Davi Alcolumbre e Deputado Hugo Motta,
A Reforma Tributária aprovada pelo Congresso Nacional foi um importante passo no caminho para a justiça tributária e fiscal. E um dos grandes avanços foi a criação de um imposto seletivo sobre produtos nocivos à saúde e ao meio ambiente, com objetivo de reduzir o consumo destes produtos, prevenindo doenças e salvando vidas.
Nos próximos meses, o Poder Executivo vai enviar ao Congresso Nacional um projeto de lei ordinária estabelecendo as alíquotas de imposto seletivo para cada produto. O país encontra-se, neste momento, portanto, diante de uma oportunidade história de fazer uso da política tributária, a mais efetiva de todas segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), para aumentar o imposto de bebidas alcoólicas, bebidas açucaradas e tabaco, reduzindo, assim, seu consumo e gerando benefícios para a saúde da população, desafogando o Sistema Único de Saúde (SUS) e gerando impactos econômicos positivos.
Nesse sentido, estamos aqui para instar os senhores para que que tomem a melhor decisão para a saúde ao estabelecer uma tributação efetiva e maior para esses produtos nocivos, de modo que a alíquota sobre bebidas açucaradas seja alta o suficiente para que, de fato, desincentive seu consumo.
Refrigerantes são bebidas adoçadas ultraprocessadas, supérfluas, e nocivas à saúde e ao meio ambiente. São produtos que aumentam o risco para obesidade, diabetes tipo 2, hipertensão e outras doenças cardiovasculares e cerebrais, câncer, doenças renais e hepáticas crônicas, entre outras. As doenças provocadas por refrigerantes e outras bebidas açucaradas impactam milhões de brasileiros: 2,2 milhões de adultos brasileiros estão com obesidade ou sobrepeso devido ao consumo destes produtos, e cerca de 721 mil crianças estão com excesso de peso pelo mesmo motivo. Por ano, são 13 mil mortes de adultos devido ao consumo de bebidas açucaradas, e o custo para o Sistema Único de Saúde é de R$3 bilhões de reais por ano.[1]
Além do impacto na saúde, refrigerantes e bebidas açucaradas impactam negativamente o meio ambiente. Considerando toda a cadeia produtiva, para produzir apenas um litro de bebida açucarada são necessários entre 300 e 600 litros de água[2]. As duas maiores poluidoras de plástico do mundo são as maiores fabricantes de refrigerantes: em 2024, a Coca-Cola foi responsável pela produção de 3,44 milhões de toneladas de plástico e a Pepsico, 2,55 milhões de toneladas [3].
No mundo, 99 países e regiões adotam impostos seletivos mais altos sobre bebidas açucaradas, entre eles Portugal, França, Reino Unido, Chile, México, África do Sul e Rússia, entre outros[4]. Uma revisão sistemática de 2022 que avaliou impostos sobre bebidas adoçadas na época mostrou queda de 15% nas vendas, e não foi identificada nenhuma mudança negativa no número de empregados das indústrias sobretaxadas[5].
Além de desincentivar o consumo destes produtos, a tributação mais alta de refrigerantes e outras bebidas açucaradas vai permitir corrigir uma terrível distorção, já que o Estado brasileiro perde pelo menos R$ 3 bilhões de reais por ano em incentivos fiscais para essas indústrias localizadas na Zona Franca de Manaus[6].
É importante destacar que impostos seletivos mais altos são bons não apenas para a saúde e o meio ambiente, mas para toda a economia e para o nosso bolso. Pelo princípio da neutralidade tributária, se o governo arrecadar mais com os impostos sobre refrigerantes, terá que arrecadar menos com outros impostos. Assim, quanto mais altos forem os impostos seletivos, menores serão os impostos que pagamos para outros produtos básicos, como roupas.
Apesar disso, as indústrias de refrigerantes e bebidas açucaradas vem usando de seu poder econômico para influenciar parlamentares por uma alíquota irrisória do imposto seletivo. Ou seja, pretendem que seus interesses de lucro se sobreponham ao interesse da saúde de milhões de brasileiros e brasileiras.
É por isso que conclamamos os senhores para que rejeitem a interferência da indústria de bebidas açucaradas em seus pareceres e decisões, e que façam cumprir a função constitucional do imposto seletivo de salvar vidas.
Referências:
[1] Instituto de Efectividad Clínica y Sanitaria. O lado oculto das bebidas açucaradas no Brasil. Alcaraz A, Vianna C, Bardach A, Espinola N, Perelli L, Balan D, Cairoli F, Palacios A, Comolli M, Augustovski F, Johns P, Pichon-Riviere A. Nov 2020, Buenos Aires, Argentina. Disponível en: www.iecs.org.ar/azucar
[2] Global Food Research Program at UNC-Chapel Hill. ULTRA-PROCESSED FOODS: A global threat to public health. Out 2023, Chapel Hill, Estados Unidos. Disponível em https://www.globalfoodresearchprogram.org/wp-content/uploads/2023/11/GFRP_FactSheet_UltraProcessedFoods_2023_11.pdf
[3] Ellen MacArthur Foundation. The Global Commitment 2024 Progress Report. 2024. Disponível em https://content.ellenmacarthurfoundation.org/m/528a7cd095787dec/original/The-Global-Commitment-2024-Progress-Report.pdf
[4] Global Food Research Program at UNC-Chapel Hill. Fiscal policies: sweetened beverage taxes. Atualizado em Maio de 2025. Disponível em https://www.globalfoodresearchprogram.org/wp-content/uploads/2025/05/GFRP-UNC_Tax_maps_drinks_2025-May.pdf
[5] Andreyeva, T., et al., Outcomes Following Taxation of Sugar-Sweetened Beverages: A Systematic Review and Meta-analysis. JAMA Netw Open, 2022. 5(6): p. e2215276.
[6] Receita Federal. Análise da tributação do setor de refrigerantes e outras bebidas açucaradas. Brasília, DF: Ministério da Fazenda, 2018. Disponível em: https://actbr.org.br/uploads/arquivos/Analise-Receita-Federal-2018.pdf